Estudos
Humanização em cuidados intensivos: qual o caminho?
13 de junho de 2017

humanização

Diante do conceito de que ‘ humanização ‘ é um processo vivencial que permeia toda a atividade do local e das pessoas que ali trabalham, dando ao paciente o tratamento que merece como pessoa humana, dentro das circunstâncias peculiares em que cada um se encontra no momento de sua internação’, como você avalia a sua atuação e o local onde trabalha?

A coordenadora do departamento de psicologia da Somiti, Tárcia Dutra, sugere a leitura do artigo ‘Buscando humanizar los cuidados intensivos’ (Gabriel Heras La Calle, Mari Cruz Martin, Nicolas Nin) e convida os profissionais a uma reflexão sobre a humanização.

“O texto “Seeking to Humanize Intensive Care” (Buscando humanizar cuidados intensivos) é extremamente pertinente. As UTIs foram montadas com excelentes equipamentos e com isso os pacientes têm maior chance de recuperação. Entretanto, no contexto que trabalho, vê-se que as unidades foram construídas sem um projeto arquitetônico que pudesse atender aos trabalhadores, pacientes e familiares.  A fantasia de um ambiente austero, de emergências, de equipamentos e trabalhos complexos parece pairar até o momento quando se observa as unidades que conheci e também já trabalhei.

Com todo o conhecimento existente sobre as necessidades de uma pessoa, quando ela vira paciente, a despersonalização se faz presente. É assustador despertar num lugar com cor pastel, luzes acesas dia e noite, barulhos e conversas em tom alto, com pessoas estranhas (‘parecendo fantasmas’, fala de uma paciente). Neste ambiente, pacientes e profissionais perdem a noção do tempo e do clima. O texto fala de uma ‘engrenagem’ na qual a comunicação é o eixo central e que a partir dela pode-se tomar decisões, mudar conceitos e estabelecer regras mais cordiais – mais humanas, sem perder o eixo dos cuidados efetivos que um paciente crítico requer. Não importa se é uma unidade neonatal, infantil, adulta ou de cuidados progressivos, os profissionais precisam ter habilidades técnicas e incluir as habilidades ‘finas, ‘leves’ da interação em prol do melhor cuidado.

Nesse ponto, eu acredito no trabalho interdisciplinar, no qual a cada momento é um o eixo chave do ato de cuidar e que as crises e os conflitos possam ser usados para o crescimento de todos. Desde o ano 2000, como psicóloga,  acompanhei  e  desenvolvi trabalhos com ênfase na empatia para com o paciente, família e equipe.  Hoje, participando da Somiti e da Abramede MG, a aposta é para que as inovações  possam abranger  os atendimentos de urgência e emergência, as  UTIs e  atrair profissionais para que façam a diferença. Acredito que quando isso  acontece todos ganham. E que todos envolvidos nesses ambientes, profissionais e usuários, sejam respeitados enquanto seres singulares. Um sonho: que os hospitais públicos e privados consigam ser modificados levando em consideração as novas realidades com o foco naquilo que nos fez sair do eixo animal.”  Tárcia Dutra, coordenadora do departamento de Psicologia da Somiti.

O artigo amplia a discussão sobre humanização  da UTI e  reforça  a necessidade não só  de uma mudança de atitude dos profissionais de saúde, mas sobretudo,  do compromisso em  ter a pessoa como o centro dos cuidados em saúde.

Destaca que o Projeto HU-CI: Humanizando os Cuidados Intensivos foi concebido com o objetivo de desenvolver ações específicas que contemplam a humanização como uma das dimensões da qualidade assistencial. Essas áreas de trabalho abrangem os seguintes aspectos:

  • Horários de visitas flexíveis,
  • Comunicação efetiva com pacientes e famílias e entre a equipe multidisciplinar,
  • Bem-estar do paciente:consiste na avaliação e controle da dor, sedação adequada, prevenção e manejo do delirium, promoção do sono, além  da avaliação e suporte das necessidades psicológicas e emocionais dos pacientes. Ressalta ainda que o bem-estar do paciente é um dos principais objetivos do cuidado ao paciente crítico.
  • Participação familiar nos cuidados:a participação da família na recuperação do paciente pode ter efeitos positivos para o paciente, para os membros da família e profissionais da unidade, pois reduz o estresse emocional, facilita a comunicação entre as partes envolvidas e principalmente promove nos familiares  maior aceitação do adoecimento,  favorecendo o processo de luto.
  • Síndrome de Bournoutpois, interfere na qualidade assistencial.
  • Detecção, prevenção e manejo da  Síndrome Pós Internação na  UTI  (PICS).Oferecer  tratamento humanizado em terapia intensiva propiciou o reconhecimento de algumas Síndromes que impactam sobremaneira a parte  física,   cognitiva e  a qualidade de vida do paciente e de seus familiares após a internação na UTI. Daí a importância da prevenção e manejo adequados não só da PICS, mas também do Estresse Pós-Traumático (PTSD) e da Doença Crítica Crônica (DCC).
  • Cuidados no final de vidacom o objetivo de reduzir o sofrimento e atender  às necessidades físicas, psicossociais e espirituais  dos pacientes e seus familiares.
  • Arquitetura e infra-estrutura: a UTI deve ter um ambiente  funcional e “saudável”, que ajude a melhorar os estados físicos e psicológicos dos pacientes, profissionais e membros da família.

O artigo aborda aspectos importantes da atuação do psicólogo na UTI e traz um novo sentido para o termo “ humanização ”, pois  aborda todas  facetas do sujeito doente e não somente  as necessidades clínicas. Além disso, reforça o compromisso  dos profissionais  de saúde em modificar a assistência  tornando-a de excelência.

Marcelle Passarinho – Especialista em Psicologia da Saúde e Hospitalar,  Coordenadora da Psicologia Hospitalar do CTI do Hospital Regional de Santa Maria- HRSM, Brasília-DF / Intensicare.

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